Eu ainda não sei bem como me
sinto. Ultimamente tem sido um vazio imenso que toma conta de mim e dos meus
dias. Nada me empolga, nada me alegra, nada desperta meu interesse como antes.
Tento, a todo custo, rir e sorrir com as coisas, com as pessoas, com os fatos.
Mas o máximo que consigo são algumas horas de uma alegria desbotada e falsa,
feita especialmente para dar conforto aos outros enquanto eu mesmo não sou
confortado. E assim se vão os minutos, as horas, os dias, as semanas, os meses.
E assim se vai minha essência.
E, no meio disso tudo, ainda olho
ao redor e encontro solidão. Encontro descaso, abandono, escárnios cochichados
ao pé do ouvido (ditos como se eu não pudessem ouvir) e silêncio. E silêncio. Um mar imenso e
devastador formado do mais duro e sólido silêncio.
Reviro na cama. Olho os números
marcando o horário na tela do celular. Já nem me importo em quantas horas são.
Não quero levantar. Não quero começar um novo dia. Não quero. Mas já estou
cansado de encarar o teto branco do meu quarto. Cansado de ficar deitado
encolhido no canto da minha cama. Cansado de chorar escondido. E, acima de
tudo, cansado.
Lembro que já se vão 3 ou 4 meses
em que eu tenho chorado praticamente todos os dias. Passei anos sem derramar
uma única lágrima, seja ela de tristeza, pesar, arrependimento ou alegria. E
agora passo dias a fio entregando um estoque quase inacabável de lágrimas
quentes. E é sempre a mesma história: acordar, vazio, vazio, vazio, um aperto no
peito, um nó no estômago, algo se mexe lá dentro como se tivesse um bicho
estranho subindo até minha garganta. Algo entala na minha garganta. Um nó. E
vazio, vazio, vazio. E então, uma a uma, elas saem. Lágrimas transparentes,
pesadas, quentes e doloridas, como se eu estivesse chorando cacos de vidro. Como se estivesse chorando a própria dor transfigurada em gotas salgadas. Como se me chorasse.
Até algum tempo atrás eu tinha
uma ilusão (muito bonita e muito sólida) de um porto seguro, de um chão firme, de
um lugar onde eu me sentia seguro, querido, importante. Até que fatos distintos
foram retirando toda a firmeza dessa estrutura. E, apesar de descobrir o que as
pessoas falam quando eu não estou por perto ter sido uma experiência
interessante, a dor lasciva e aguda que sempre brota em meu peito quando me
recordo das palavras duras, secas e insensíveis. É como diz aquele ditado: “A
traição só dói porque ela não vem de um inimigo” ou algo assim. E é a mais pura
verdade.
Mas ainda assim me pego pensando
se eu reagiria diferente se passasse por essa experiência em uma época mais
estável da minha vida. Onde meu psicológico não estivesse em frangalhos e
minhas defesas não estivessem tão enfraquecidas. Talvez eu confrontasse. Talvez
eu fosse atrás de respostas ou só ignoraria (como fiz com outros fatos). Mas
não passei por isso em outra época. Passei por isso agora. Onde eu me sinto
mais vazio, mais sozinho, mais largado. E eu já nem sei como meu coração ainda
bate. Cada vez que acordo eu sinto-o doer. Como se uma agulha grossa e pontuda espetasse
o meio do coração, furando o músculo a todo instante, atravessando a carne sem costurar nada.
E todas as noites tenho que
respirar fundo tantas vezes, beber água tantas vezes, limpar meu rosto tantas
vezes que cada músculo retesado do meu corpo dói. E é nessas horas que fico
imaginando como seria não sentir mais essa dor, esse vazio, esse silêncio. Como
seria tão mais fácil simplesmente não acordar mais. Não precisar mais abrir os olhos, mexer nos cabelos, caminhar, viver... A janela me parece uma
alternativa. Um voo alucinante de 10 andares. Os remédios me parecem uma alternativa. Uma viagem sonolenta de 20 comprimidos. A minha velha conhecida
lâmina me parece uma alternativa. Uma antiga amizade de 6 cortes. Mas eu simplesmente queria deitar, fechar os
olhos e não sentir mais essa dor que cresce e machuca todos os dias e todas as
noites, como se estivesse tão grande que a qualquer momento ela iria irromper
pelo meu peito, explodindo meu tórax, expulsando-me de mim mesmo. E eu só queria não ter que acordar mais.
Mas passam-se as horas, passam-se
os dias e eu volto a despertar. Eu só não sei ainda até quando.