sábado, 28 de abril de 2012

~ Guilherme

Um emaranhado de fios coloridos pintava minha mesa. Aquele novelo em furta-cor deixado ali por um qualquer quebrava todo o tom sério do quarto arrumado. Minhas prateleiras apinhadas de livros tantos. As paredes de um verde calmo e singelo que rebatiam a luz do dia que adentrava pela minha janela. Alguns pôsteres e desenhos tingiam as paredes, enquanto uma caixinha contendo duas pequenas bolas de meditação, que retiniam ao serem agitadas. Tudo metodicamente arrumado.
Sentado no canto da cama, juntei minhas pernas em um abraço solitário. Ajeitei meus óculos enquanto despia a boina marrom. E chorei. Deixei que minhas lágrimas gritassem pelo silêncio vazio que habitava em mim. Era Natal e nem mesmo as cores festivas e os brilhos singelos da época despertavam em mim qualquer espírito de boa nova.
O ceifeiro que carregou em suas asas negras a imensidão colorida do fim de ano veio em forma de mensagem. Um bipe, um toque, uma leitura, meia dúzia de palavras mortas e o fim. Recebi o baque de peito aberto, perdi o ar, vi o chão escorregar por entre minhas pernas e a raiva e frustração explodirem em meu peito e então se fecharem no meu palácio de silêncio.
E com o tempo, a dor cedeu lugar a novas companheiras. A decepção e raiva chegaram juntas, mesclando suas cores mórbidas em mim e tingindo meu silêncio inquieto. E tudo que eu tinha eram silêncio e solidão. Minha mãe veio me chamar para o dia de confraternização. Levantei-me, vesti minha melhor face, armei-me de minha mais segura alegria-falsa e segui o solfejo natalino. E meus olhos eram a única forma de chegar à dor escondida em mim.
Após a semana de luta solitária, recebo enfim pares de asas cintilantes e de uma quentura reconfortante. Duas asas enormes, com penas compridas, fortes e que retiniam em uma risada histérica e divertida. Duas asas quietas, já há muito conhecidas e usadas por mim, que soltavam, vez ou outra, suspiros divertidos e silêncios companheiros. E recebo enfim um par de asas negras, novas e lisas, que cintilavam o sol da manhã. Presentes que recebi e que me fizeram erguer novamente meu voo e juntar os cacos de força que havia em mim.
                Meus olhos agora estão erguidos, firmes; por trás de minhas lentes claras observo novamente as mudanças ao meu redor. Enfrento meus medos e batalho contra meus próprios demônios ao lado de minha alma virgem. Entoo meus mantras e solfejo o bafo morno e colorido do outono enquanto caminho e traço minhas linhas astrológicas.
                E hoje sou novo. Sou renovado. Experimento, minto, brinco, rio. Invento novos Guilhermes por aí, me refaço, remodelo. Mas acima de tudo me torno Guilherme. Um virgem em gêmeos, um amigo, filho e irmão. Mas Guilherme!

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