Escrevo por me sentir só. E puramente
por isso. Resgato-me pelas linhas e voltas de cada letra, costurando as palavras e
formando pelo emaranhado de tinta um castelo, uma planície, um mundo só meu. Um
mundo que posso percorrer os vales distantes, voar no céu mais limpo, mergulhar
no mais profundo oceano e ser só meu. E, quem sabe, abrir as portas desse meu
mundo só meu para outros, para que eles possam encontrar um mundo deles só
deles.
Escrevo pelo simples fato de não
segurar minhas mãos nem amarrar minha mente quando o impulso de criar me
arremete. Escrevo porque sinto falta de tudo e de nada, daquilo que jamais foi
meu e daquilo que jamais quero de volta e mesmo assim procuro. Escrevo por
estar sozinho ou por me sentir completamente acompanhado de um vazio maciço ou
cercado de pessoas vazias ou cheias de si mesmas.
Escrevo porque foi a única arte
a que me foi destinada. Não possuo o trinado dos pássaros, nem a leveza para a
ponta da bailarina. Não possuo dedos ágeis nem sopro forte para os instrumentos.
Não pinto, nem desenho, nem interpreto. Não sei fazer pessoas pararem o que
estão fazendo para ouvir minha voz, minha música ou ver minhas cores na tela. E
escrevo porque fui destinado a isso, por completar o pequeno pedaço de espaço
vazio que cerca o jardim concêntrico da minha vaga existência.
Escrevo porque posso bordar com
palavras a simplicidade que cerca a vida de todos e minha. Porque posso florear
as esquinas simplórias e encher de vida aquele sopro de fim de dia, onde o
cansaço do dia corrido já bloqueia a visão das cores. Escrevo porque preciso
colocar para fora o que guardei em meditação. Preciso exteriorizar aquilo que
guardei em mim e esperar que o outro encontre no meu relicário secreto aquilo
que ele buscou e fazer das minhas palavras às dele.
Escrevo porque me apetece a
alma, porque me completa, porque me faz bem. Escrevo porque quero que o outro
leia, para que o outro entenda e se identifique. Escrevo para que minhas
palavras se percam no silêncio morno do anonimato daquilo que ninguém lê que ninguém
vê que ninguém quer. E para que minhas palavras construam em mim mesmo a teia
que me sustentará quando tudo cair. E que essa mesma teia seja o alicerce do
castelo de outrora, que me servirá de refugio quando casa nenhuma me servir de
abrigo.
Escrevo porque eu quero. Porque
tenho tempo para matar e minutos para gastar. Escrevo porque tenho tinta e
tenho papel. Porque tenho lápis, borracha, caneta, teclado, carvão, giz e
sangue. Escrevo porque meu próprio sangue já se bordou de palavras e costurou
letras em sua dimensão. Escrevo porque sou desses tolos que acreditam em
contos, que sugam sonhos, que vivem magias e voam em pensamentos. Escrevo
porque preciso e porque precisam. Porque tenho que escrever.
E escrevo pelo simples fato de
poder amar. Por poder ser livre para escolher as letras e grifar as palavras.
Por poder ser pai, mãe, avó, avô e tio de cada uma das vogais. Escrevo porque
quero, porque sonho, porque sou apedrejado no meio da noite e no raiar do dia
por uma infestação dissonante de palavras e ideias e porque mergulho cada vez
mais fundo nessa chuva de cores que chamo de inspiração e que absorvo cada gota
dessa maré estranha e rápida.
Escrevo porque leio e porque
quero. Escrevo pelo fato de poder escrever, pelo prazer de sonhar e pelo
barulho das teclas, pelo riscado do papel e pelo cheiro da obra. Escrevo por escrever...
e só.
"Escrevo porque foi a única arte a que me foi destinada. Não possuo o trinado dos pássaros, nem a leveza para a ponta da bailarina. Não possuo dedos ágeis nem sopro forte para os instrumentos. Não pinto, nem desenho, nem interpreto. Não sei fazer pessoas pararem o que estão fazendo para ouvir minha voz, minha música ou ver minhas cores na tela. E escrevo porque fui destinado a isso, por completar o pequeno pedaço de espaço vazio que cerca o jardim concêntrico da minha vaga existência."
ResponderExcluirIsso definiu PERFEITAMENTE a singularidade que é a escrita. <3
Muito do bom este texto, espero que continue "a escrever e só". Espero poder ler outros como este e em cada passada deixar a minha referência sobre sua colocação ideal de seus textos. Gostei muito, ressalvo estes trechos: "Porque posso florear as esquinas simplórias e encher de vida aquele sopro de fim de dia"; "Escrevo porque preciso colocar para fora o que guardei em meditação."
ResponderExcluirParabéns.
meu blog, quando quiser: http://umaestrelanochao.blogspot.com.br/