Descanso meu corpo vazio na cama desarrumada, enquanto escuto o som do
vazio reverberar nas quinas brancas das paredes do meu quarto. A cabeça
fatigada, destruída, confusa e perdida, pendendo de um lado, repousada no
travesseiro mole. E os olhos perdidos.
Deixo que
minha mente viaje por todo o bosque de arquivos de memórias intituladas sobre
você. Passeio pelos corredores mentais abrindo gavetas, revirando arquivos,
mexendo nas caixas. Tiro tudo do lugar, reorganizo, repenso, repaço, desfaço. Já
não importa mais.
Depois de recatalogar tudo por mais de 5 vezes minha cabeça já está
nauseada de tanto persistir em te entender, de tanto tentar encontrar as
brechas naquelas atitudes, naqueles olhares. Cerro meus olhos para me
concentrar. Já não quero mais ter que me martirizar e me reorganizar a cada
palavra, gesto, frase, olhar, sumiço seu. Já não aguento mais.
Depois que eu te encontrei, pela primeira vez, me lembro de ter me
sentido como num baile multicolorido, repleto de alegria, músicas, cheiros,
sabores. Queria me preencher de tudo aquilo. Queria me afogar nesse mar de
sentimentos tantos. Hoje percebo que o baile, na verdade, era um baile de
máscaras, onde demônios disfarçados esgueiravam-se pelas sombras, atormentando
os dançarinos, desfazendo as decorações, roubando as cores. E já não existem
taças a tilintar em brindes festivos, nem bebidas esfumaçantes ou borbulhentas,
nem o mosaico de cores e cheiros doces que planavam pelo ar. O salão está
vazio. Apagaram as luzes.
Estou agora no meio do salão, sentado sozinho, segurando a pasta com os
arquivos mais bonitos e alegres que consegui resgatar da sua sessão de
memórias. O chão parece frio demais. O ar parece pesado demais. E já não
suporto tanto o peso das minhas roupas. Mas abraço com força o arquivo. Queria que
aquilo voltasse a existir. E me desiludo.
Meus olhos se abrem novamente, acordando demoradamente do sonho
bailado. Pisco um par de vezes enquanto a luz da tarde banha minhas formas e
brinda meus olhos castanhos com um brilho forte. Não quero me levantar. O pijama
parece confortável demais. Viro para o lado voltando a retesar-me na decisão
mental. Há muito já havia percebido que não há mais espaço para alguém como eu.
Uma presença quase invisível, quase... celofânica. Fina, transparente,
esquecida.
Não nego as lágrimas. Elas já foram minhas únicas companheiras por
tanto tempo. Dediquei àquela presença meu tempo, meu ar, meu coração, minha alma,
meu eu, minhas palavras, meus olhares, meus sonhos. Mas ela nunca leu minhas
linhas, nunca olhou os meus olhos, nunca reparou no meu sorriso. Jamais se
aventurou em meu ser e nem ao menos quis se entregar a mim como eu me
entreguei. E me culpo.
Levanto. Despenteio ainda mais os cabelos despenteados. Percorro a
casa, busco o café, penso. Agora já não me importa mais. Já não preciso tanto
dos seus olhares, da sua voz, do seu abraço inexistente. Estou cansado demais
para me importar com o que você acha, o que pensa, o que faz, o que precisa. Estou
cansado. Somente isso.
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